marcos.vargens (30-04-2013, 20:16) escreveu:Em um país onde o legislativo está votando um projeto de lei que permite a ele anular sentenças do judiciário, isso não é nada.
É off-topic, mas acho que vale a pena um esclarecimento.
A PEC 33, que define o poder recursal do Congresso em relação a leis declaradas inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, entrou em tramitação no Congresso em 2011, é de autoria de um deputado da situação e relatado por um deputado da oposição. Era conhecido como a "PEC dos evangélicos" pelo fato de setores religiosos do parlamento estarem descontentes com decisões tomadas pelo STF tais como o reconhecimento de relações homafetivas, a permissão para pesquisas com células-tronco e o aborto de anacéfalos. Esta proposta entrou na agenda da Comissão de Constituição e Justiça no início deste ano, sendo analisada pela mesma recentemente. A decisão da CCJ diz respeito apenas se a proposta cumpre os requisitos constitucionais para continuar em tramitação, ou seja, o mérito da proposta sequer foi analisado. Quando os deputados votaram a favor não estavam concordando com a proposta, apenas dizendo que ela atende os requisitos para ser submetida ao plenário futuramente onde, aí sim, será analisado o mérito. Para que a proposta se transforme em lei, ela deve ser aprovada em votação com maioria qualificada em dois turnos tanto na Câmara quanto no Senado. Há ainda muito chão para se percorrer até que ela vire lei.
O problema é que há um princípio de crise institucional derivado da dificuldade do sistema político brasileiro em resolver questões políticas dentro do âmbito político. Quando um grupo político perde uma disputa política eles acabam por recorrer na justiça tentando reverter a decisão (ou, como se diz no jargão do futebol, tentam ganhar no tapetão). E na Justiça encontram magistrados dispostos a agir de maneira mais política (seja por considerar necessário tal atuação ou em busca de maior prestígio e poder), que invariavelmente acabam por adentrar em competências exclusivas do Poder Legislativo, ferindo o princípio constitucional da independência dos poderes. Outra questão que favorece esse quadro é quando os próprios políticos abdicam de decidir questões socialmente delicadas por temer consequências eleitorais. Este vácuo decisório acaba indo parar na Justiça, que se vê obrigada a decidir questões que envolvem inclusive direitos fundamentais de cidadania.
A PEC 33 acabou por ser utilizada nesse contexto de diputa política que envolve o parlamento e o Poder Judiciário, e foi tratada de maneira leviana pela grande imprensa, levando mais desinformação que informação ao seu público.
Para quem se interessar,
este artigo trata do uso político da PEC 33 nas contendas recentes entre Legislativo e Judiciário, e
este artigo aborda as questões jurídicas e políticas que envolvem a PEC 33 como um todo.